terça-feira, 13 de março de 2012

O DEFUNTO VISITANTE


Após solicitação da presidência do Conselho de Kadosch de Brasília para apresentação de um trabalho para uma elevação ao Gr.'. 30, na data marcada estava cumprida essa obrigação. Essa peça de arquitetura deveria ser publicada no Boletim do Supremo Conselho. Juntamente com esse trabalho foi enviada prancha ao Supremo Conselho comunicando também o falecimento do Ir.'.  Nicolas, o grego.
Para surpresa de todos, o Boletim do Supremo Conselho do Brasil não publicou o " trabalho " mas trazia na sua Coluna Fúnebre a relação dos Irmãos falecidos, e entre eles estava o meu nome completo: Innocêncio de Jesus Viégas.
Não demorou muito, os velhos amigos passaram a expressar suas condolências à suposta viúva. Entre inúmeras demonstrações de solidariedade algumas curiosas merecem destaque.
Um velho Ir.'. desejava comprar alguns livros de minha Biblioteca, outro também viúvo deixava transparecer nas entrelinhas o desejo de continuar o meu trabalho ao lado dela, não por questão de sexo, mas pela convivência, pois a solidão é muito dolorosa. Outro Ir.'. velho companheiro de farda comunicou em carta o meu comparecimento a uma sessão espírita onde havia deixado psicografada uma linda mensagem encorajadora a todos os IIr.'.
Apesar da correção posterior efetuada na publicação do Boletim do Supremo Conselho, aproveitei a estada do Ir.'. Raimundo do Or.'. de Boa Vista, em minha cidade e autografei um livro e mandei por este portador ao Am.'. Ir.'. Norberto Delegado do Grão Mestre daquele mesmo Estado.
Isso era Outubro de 1994, o Ir.'. Norberto recebeu o presente, ficou feliz, e logo em seguida recebeu o Boletim do Supremo Conselho, referente aos meses Julho/Agosto de 1994 e lá encontrou o meu nome como tendo falecido em Agosto  Esse Am.'. Ir.'. entre arrepios, não entendia como um morto em Agosto oferecia e assinava um livro em Outubro e após urgente contato telefônico com a suposta viúva que confirmava "eu estava vivo".
Um belo dia em viagens de negócios pelo Interior, desejei visitar os trabalhos de uma Loja onde sabia ter um velho companheiro de caserna. Quando cheguei já era tarde e já estavam trabalhando. Bati a porta como de costume e como resposta à ordem para esperar. Logo veio o 1º Exp.'. com o livro para colher a assinatura e levar a identidade civil e maçônica para a conferência do Ir.'. Orador.
Vou relatar aqui o que ocorreu lá dentro e que me foi contado pelo laborioso Ir.'. Secretário, que a tudo viu e ouviu e registrou em sua longa Ata.
Chega o Experto com o livro e as identidades. Entrega ao Orador. O velho guardião da lei lê atentamente. Logo empalidece ao descobrir um grande acontecimento e quase sem poder falar, olha para o Venerável Mestre e balbucia algumas palavras imperceptíveis. O Venerável pede gentilmente ao Orador para repetir suas palavras "um pouco mais altas".
O Orador, recobrando as forças, diz: "Venerável Mestre, algo de anormal está acontecendo. Esse Ir.'. que bate à porta do nosso Templo é o falecido Innocêncio aquém na última sessão prestei solene homenagem pelo seu passamento, e agora, diante de seus documentos, não sei o que fazer. Quero ajuda de algum Ir.'. entendido em coisas do outro mundo para clarear essa fantasmagórica situação!".
O Mestre de Harmonia diante do caso querendo colaborar com a ocasião colocou em surdina a marcha fúnebre de Mozart. Aprendizes e companheiros, admirados e congelados, aguardavam os desfecho. Todos os irmãos passaram a sentir arrepios. O medo era geral. Um dos IIr.'. dizendo-se entendido no assunto, se ofereceu para assumir o comando da situação e passou a pedir calma a todos. Fechou os olhos respirou ofegante, estendeu os trêmulos braços na horizontal, e falou com voz rouca: "O Ir.'. Innocêncio veio pedir luzes. Você, Ir.'. Orador, o elogiou bastante na sessão passada e ele quer agradecer. Pensa que ainda está materialmente entre nós. Deixai que entre".
Eu lá fora, inquieto com tanta demora, resolvi ir ao banheiro. Nisso a porta se abre e o Ir.'. cobridor não me vê na sala. Morrendo de medo, imediatamente fechou a porta e anunciou: Ir.'. 1º Vigilante, o fantasma foi embora! ".
Com o abrir da porta interrompi o que estava fazendo e voltei imediatamente pensando em entrar logo, mas logo me dei conta que a porta estava fechada. Esperei um pouco, fiquei de costas para a dita porta, olhando as fotografias dos futuros IIr.'. que estavam coladas nos editais.
Abre-se a porta outra vez. Era o Mestre de Cerimônias que espiava só com um olho. Voltei a cabeça e esbocei um sorriso. E a porta foi fechada abruptamente. Bem, já que não vou entrar - pensei - vou terminar o serviço que bruscamente havia interrompido, e fui para o banheiro outra vez.
Dentro do Templo, o Mestre de Cerimônias informava solenemente que eu estava lá fora o cobridor, sem acreditar, imediatamente abre a porta e mais uma vez nada vê. Aí pirou de vez. O suposto médium passa a consolar o cobridor, dizendo-lhe que não era vidente e por isso não conseguia ver o espírito do Ir.'. Innocêncio, mas que fizesse um esforço concentrado que logo conseguiria.
A essa altura um Ir.'. pede a palavra "pela ordem" e solicita ao Venerável retirar do Templo os aprendizes e os companheiros, que ainda não se achavam em condições de assistir esse encontro de um morto com os vivos em Loja. Aprovada a solicitação, o Venerável pede ao Mestre de Cerimônias que retire os aprendizes e companheiros.
Logo um nervoso companheiro pede a palavra, antes de ser cumprida a ordem do Venerável, e questiona que não era justo sair e ter que ficar na sala dos p p. com o defunto. Todos concordaram com a ponderação e o Venerável revogou a ordem.
Contornada a situação o Venerável pede ao Mestre de Harmonia a execução de música mais suave para receber o Ir.'. finalmente, abre-se a porta, a música suave da Ave Maria me deixa todo emocionado.
Entrei, fiz o que normalmente se faz e esperei a ordem do Venerável para tomar assento o silêncio dominava a cena. O Venerável disse: "vinde saudoso Ir.'. ao encontro de seus IIr.'. que, emocionados, lamentam a vossa desencarnação. Acomodai-vos no Oriente onde é o vosso lugar!".
Saí passo a passo meditando sobre aquelas palavras. Logo reconheci o velho Ir.'. que era o Orador e olhei para ele com ar de riso. Ele fechou os olhos e baixou a cabeça tristemente. O Venerável Mestre, olhando-me bem firme, disse: "O pranteado Ir.'. vem deixar a sua mensagem, estamos prontos, podeis fazer uso da palavra se esse for o vosso desejo".
Lá fora chovia bastante e vez por outra se podia ouvir o ribombar dos trovões e perceber o clarão dos relâmpagos. Coincidência ou não quando levantei para fazer uso da palavra, uma enorme claridade iluminou tudo e um ensurdecedor barulho de trovão nos deixou estarrecidos.
A luz elétrica imediatamente apagou, ficando apenas as luzes tímidas das velas a iluminar o recinto ao mesmo tempo em que a gritaria na Loja foi desesperadora. Todos querendo sair ao mesmo tempo, uns caindo sobre outros. Pisotearam o Ir.'. cobridor que jazia inerte, todo amarfanhado, e foi imediatamente arrastado para fora por um Ir.'. mais corajoso.
Fiquei só, dentro da Loja. Em vista disso, também com as pernas trêmulas depois de tamanho susto, aproveitei para sair da Oficina e aí ouvi um grito vindo lá de fora: "Lá vem à alma penada!..." E a correria rumo ao portão da frente foi geral e só alguns "sem pernas" ficaram na sala dos p.p. Só aí, depois de ter sido chamado de "alma penada", pude entender todo o desespero dos IIr.'. e imediatamente tratei de esclarecer o que realmente acontecera, que eu estava vivo que foi um erro de publicação do Boletim e que já estava sendo retificado.
A maioria já tinha ido embora para casa não sei como, inclusive o Orador, o meu velho amigo. Nisso volta o falso médium e, ainda ressabiado, olha para dentro e sem entender aquele silêncio, brada com voz enérgica própria dos doutrinadores "Irmão do Além, já passa da meia-noite! A vossa hora terminou. Ide em paz e o senhor vos acompanhe!...".
O Venerável Mestre, um nordestino bem brabo, olha para o falso médium e diz: "deixa de ser frouxo, cabra da peste! Olha a tua calça como está toda molhada. E pelo cheiro forte, não é água da chuva, não! Não estás vendo que o Ir.'. está vivo?".
A gargalhada foi geral. O Venerável pediu mil desculpas e como apreciador das boas coisas, convidou a todos para comemorar a minha "ressurreição". E disse mais: "Quem correu, perdeu!".
O resto da noite foi curta para recordamos o episódio, bebericar o gostoso vinho e rir à vontade dos "corajosos Ir.'. " Que jamais esquecerão " O DEFUNTO VISITANTE ".

Autor: Ir.'. Innocêncio Viégas         -        
Conto Resumido do Livro Contos, Cantos e Encantos   -

3 comentários:

  1. Caríssimo, muito interessante seu conto, tanto do ponto de vista do fato quanto da escrita!!
    Harllen.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado pelas palavras, mas os créditos devem ir para o autor: Ir.`. Innocêncio Viégas.
      Abraços

      Excluir
  2. Gostei deste mui Ir Filósofo, o Grande GADU vai me dar oportunidade de Filosofar para todos IIr.

    ResponderExcluir